18 de abr. de 2009

descarrilho

Pelo o que me diz respeito
Eu sou feita de dúvidas
O que é torto, o que é direito
Diante da vida
O que é tido como certo, duvido
E não minto pra mim
Vou montada no meu medo
E mesmo que eu caia
Sou cobaia de mim mesma
No amor e na raiva
Vira e mexe me complico
Reciclo, tô farta, tô forte, tô viva
E só morro no fim
E pra quem anda nos trilhos cuidado com o trem
Eu por mim já descarrilho
E não atendo a ninguém
Só me rendo pelo brilho de quem vai fundo
E mergulha com tudo
Pra dentro de si
Lá do alto do telhado pula quem quiser
Só o gato que é gaiato
Cai de pé...

2 de jan. de 2009

saudade

primeiro verso do ano
é pra você
brisa que passa
deixando marca de brasa

12 de out. de 2008

conforme





eu penso conforme o tempo
eu danço conforme o passo
eu passo conforme o espaço
eu amo conforme a fome
eu como conforme a cama
eu sinto conforme o mundo

mas no fundo
eu não me conformo

4 de out. de 2008

Sem drama.

Sempre acho que namoro, casamento, romance tem começo, meio e fim. Como tudo na vida. Detesto quando escuto aquela conversa:
- 'Ah, terminei o namoro... '
- 'Nossa, quanto tempo?'
- 'Cinco anos... Mas não deu certo... Acabou'
- É não deu...?
Claro que deu! Deu certo durante cinco anos, só que acabou.
E o bom da vida, é que você pode ter vários amores.
Não acredito em pessoas que se complementam. Acredito em pessoas que se somam.
Às vezes você não consegue nem dar cem por cento de você para você mesmo, como cobrar cem por cento do outro?
E não temos esta coisa completa.
Às vezes ele é fiel, mas não é bom de cama.
Às vezes ele é carinhoso, mas não é fiel.
Às vezes ele é atencioso, mas não é trabalhador.
Às vezes ela é malhada, mas não é sensível.
Tudo nós não temos.
Perceba qual o aspecto que é mais importante e invista nele.
Pele é um bicho traiçoeiro.
Quando você tem pele com alguém, pode ser o papai com mamãe mais básico que
é uma delícia.
E às vezes você tem aquele sexo acrobata, mas que não te impressiona...
Acho que o beijo é importante... E se o beijo bate... Se joga... Se não bate... Mais um Martini, por favor... E vá dar uma volta.
Se ele ou ela não te quer mais, não force a barra.
O outro tem o direito de não te querer.
Não lute, não ligue, não dê pití.
Se a pessoa ta com dúvida, problema dela, cabe a você esperar ou não.
Existe gente que precisa da ausência para querer a presença.
O ser humano não é absoluto.
Ele titubeia, tem dúvidas e medos, mas se apessoa REALMENTE gostar, ela volta.
Nada de drama.
Que graça tem alguém do seu lado sob chantagem, gravidez, dinheiro, recessãode família?
O legal é alguém que está com você por você.
E vice versa.
Não fique com alguém por dó também.
Ou por medo da solidão.
Nascemos sós. Morremos sós. Nosso pensamento é nosso, não é compartilhado.
E quando você acorda, a primeira impressão é sempre sua, seu olhar, seu pensamento.
Tem gente que pula de um romance para o outro.
Que medo é este de se ver só, na sua própria companhia?
Gostar dói.
Você muitas vezes vai ter raiva, ciúmes, ódio, frustração.
Faz parte.
Você namora um outro ser, um outro mundo e um outro universo.
E nem sempre as coisas saem como você quer...
A pior coisa é gente que tem medo de se envolver.
Se alguém vier com este papo, corra, afinal, você não é terapeuta.
Se não quer se envolver, namore uma planta. É mais previsível.
Na vida e no amor, não temos garantias.
E nem todo sexo bom é para namorar.
Nem toda pessoa que te convida para sair é para casar.
Nem todo beijo é para romancear.
Nem todo sexo bom é para descartar. Ou se apaixonar. Ou se culpar.
Enfim...
Quem disse que ser adulto é fácil?



Arnaldo Jabor

29 de set. de 2008

Para enfeitar a noite do meu bem

Hoje eu quero a rosa mais linda que houver
E a primeira estrela que vier
Para enfeitar a noite do meu bem
Hoje eu quero paz de criança dormindo
E o abandono de flores se abrindo
Para enfeitar a noite do meu bem
Quero a alegria de um barco voltando
Quero ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem
Ah ! Eu quero amor, o amor mais profundo
Eu quero toda beleza do mundo
Para enfeitar a noite do meu bem
Quero a alegria de um barco voltando
Quero ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem
Ah ! Como esse bem demorou a chegar
Eu já nem sei se terei no olhar
Toda a ternura que eu quero te dar

23 de set. de 2008

os corpos se entendem, mas as almas não

Se queres sentir a felicidade de amar,
Esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.
Deixe o teu corpo entender-se com outro corpo,
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

16 de ago. de 2008

sobre a liberdade

A liberdade é um mistério,

todo dia se decifra

todo dia se disfarça.

A liberdade é só presente,

não promete pro futuro

não comete ter saudade.

A liberdade é traiçoeira

que nem amor de menina

se amoita em cada moita

se esquiva em cada esquina.

A liberdade é vaidosa,

quer cuidados e desejos

quer escovas e limpeza.

A liberdade é muito prosa,

penteada e caprichosa.

12 de ago. de 2008

28 de jul. de 2008

Colhe o dia, porque és ele

Uns, com os olhos postos no passado
Vêem o que não vêem: outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.
Por que tão longe ir pôr o que está perto —
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.
Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos.
Colhe o dia, porque és ele.
Ricardo Reis

3 de jul. de 2008

rooms of her own


Comigo me desavim,

Sou posto em todo perigo;

Não posso viver comigo,

Nem posso fugir de mim.

20 de jun. de 2008

liberté

Nos meus cadernos de escola

Nesta carteira nas árvores

Nas areias e na neve

Escrevo teu nome

Em toda página lida

Em toda página branca

Pedra sangue papel cinza

Escrevo teu nome

Nas jungles e no deserto

Nos ninhos e nas giestas

No céu da minha infância

Escrevo teu nome

Nas maravilhas das noites

No pão branco da alvorada

Nas estações enlaçadas

Escrevo teu nome

Nos meus farrapos de azul

No tanque sol que mofou

No lago lua vivendo

Escrevo teu nome

Nas campinas do horizonte

Nas asas dos passarinhos

E no moinho das sombras

Escrevo teu nome

Em cada sopro de aurora

Na água do mar nos navios

Na serrania demente

Escrevo teu nome

Até na espuma das nuvens

No suor das tempestades

Na chuva insípida e espessa

Escrevo teu nome

No trampolim desta porta

Nos objetos familiares

Na língua do fogo puro

Escrevo teu nome

Em toda carne possuída

Na fronte de meus amigos

Em cada mão que se estende

Escrevo teu nome

Na vidraça das surpresas

Nos lábios que estão atentos

Bem acima do silêncio

Escrevo teu nome

Em meus refúgios destruídos

Em meus faróis desabados

Nas paredes do meu tédio

Escrevo teu nome

Na ausência sem mais desejos

Na solidão despojada

E nas escadas da morte

Escrevo teu nome

Na saúde recobrada

No perigo dissipado

Na esperança sem memórias

Escrevo teu nome

E ao poder de uma palavra

Recomeço minha vida

Nasci pra te conhecer

E te chamar

Liberdade

19 de jun. de 2008

enjoying the light



Quando é dia
teu olhar
água clara
teu olhar
pela fresta
do olhar
procurava
teu olhar
minha alma, minha calma, estrela-dalva.
Ventre, serpente, lua,

coisa tua,
rosa só de mucosa,
coisa crua,
muda, carnuda, seda,
ser da vida
sede viva
veio no apelo me rogar.
Ida na proibida idade,

pois arde
que seja tarde.
Ardilosa, dosa prosa sinuosa

estrela-guia
que me salva quando chega o dia.

29 de mai. de 2008

uma doçura de burrice

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.


Clarice Lispector

sobre estar só

agora, a verdade:
cada dia
é uma eternidade.

18 de mai. de 2008

evapore

minha memória evapore

feito a água

de uma lágrima

minha lembrança se vá

sem deixar lembrança alguma

em seu devido lugar

se um dia eu esquecer

que você nunca me esquecerá

o prazer de usar a linguagem é um dos prazeres humanos maiores.